sexta-feira, 6 de março de 2009

A velha máquina

PT sempre 13!
Trabalho,Terra e Liberdade

Partido dos Trabalhadores 13! O MEU PT é 13 ,SEMPRE!

Há pouco tempo, qualquer forma de estatismo era demonizada no pretenso universo privado dos ideais neoliberais. Visto como atrasada e incapaz de dar conta da modernidade, a nebulosa estatal era compreendida como um resto da influência do comunismo no mundo ocidental.

Se, por um lado, os interesses políticos são sólidos como rochas, o discurso político é volúvel, adaptando-se a cada circunstância. Em uma visão ingênua, ninguém mente, a retórica não existe e o que se diz é o que se deseja. A manipulação é uma ficção e tudo que se vê, revela, automaticamente, os interesses intestinos subjacentes. O mundo não precisa ser interpretado. Não existem segredos bem guardados e basta seguir a opinião comum socialmente compartilhada e co-validada, a cada momento, pelas mídias.

Em um exemplo, há pouco tempo, qualquer forma de estatismo era demonizada, no pretenso universo privado dos ideais neoliberais. Visto como atrasada e incapaz de dar conta da modernidade, a nebulosa estatal era compreendida como um resto da influência do comunismo no mundo ocidental. O Estado deveria se desocupar da economia, da educação e da saúde. Ainda bem, que pelo menos por aqui, essas idéias jamais foram integrais, consensuais e o desmonte não se completou, apesar de causar danos significativos. Imagine-se se não se pudesse contar com o Estado para diminuir os efeitos da atual crise.

A onda privatista das empresas governamentais e de parte dos serviços públicos foi suavizada, bem antes da atual crise econômica internacional. Acidentes de percurso, tais como o da crise argentina (2002), acenderam a luz vermelha. A privatização manteve-se como crença e prática limitada. Alguns dos seus mitos permaneceram de pé. No Brasil, um deles é o da independência do Banco Central. Vamos com calma! Independência de quem? Jamais se viu este Banco, construído com a mais-valia dos trabalhadores, desenvolver qualquer política que interessasse à maioria. O conceito de democracia dos banqueiros, rentistas e de seus prepostos estatais não inclui as demais pessoas e interesses. Eles esperam que a política de Estado sirva aos seus interesses e de mais ninguém.

Por isto, diferentemente de antes, agora, fortalecer o Estado, desde que ele sirva para manter os interesses de sempre, tornou-se algo emergencial aqui e pelo mundo afora. Antes era umpecado. No momento, os países centrais dão o maior exemplo. Ninguém imaginava ver governos estatizando bancos e, novamente, intervindo fortemente nas economias. O caso argentino da corajosa nacionalização da previdência privada é espantoso. Pelo menos, por lá, os contribuintes não ficarão sem suas cotas.

A história do Estado nacional brasileiro, como de muitos outros países, não é necessariamente motivo de júbilo. Ele nasceu como representante dos senhores de escravos, lutando para afirmar o nacionalismo escravista anti-britânico que inspirou sua constituição, ao longo do século XIX. Seu ápice e sua crise ocorreram no governo de Pedro II, deposto quando resolveu abolir a escravatura.

Na fase denominada República Velha (1889-1930), o Estado foi, sobretudo, um comitê dos negócios da exportação de produtos ainda coloniais, principalmente, do café. Serviu, também, para tentar disciplinar a modernização conservadora da sociedade. Esta conviveu com algumas rebeliões rurais - a mais importante foi Canudos - e com a emergência do movimento operário urbano, que jamais aceitou as terríveis condições de vida do proletariado local. De país dos escravos do passado, o Brasil passou a ser o refúgio de imigrantes pobres, que vieram substituir o tráfico, desde de antes do fim da monarquia (1889) e que trouxeram para o país as angústias e felicidades do movimento operário europeu. Este encontrou terreno relativamente fértil, no pós-Abolição.

A idéia de que a questão social era um caso de polícia substantivou a existência de um Estado paradoxal, republicano-aristocrático. Este era liberal no discurso, profundamente autoritário e emulador de uma perspectiva europeizante. Fingia-se que o Brasil era um país de brancos, jogando para debaixo do tapete os negros, os índios e seus descendentes. Ao mesmo tempo, não se aceitava a tendência política dos imigrantes, sobretudo dos italianos e espanhóis que trouxeram para o Brasil o anarquismo, o socialismo e o comunismo. O Estado continuava a ser senhorial e vinculado à propriedade da terra. A diferença é que o poder central tinha que negociar mais com os poderes regionais, mantendo-se a supremacia do triângulo de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

O paradoxo da República Velha foi modificado na Era Vargas, que se estendeu de 1930 a 1964, com inúmeras inflexões, golpes de Estado e diferenças. Tudo começou com o golpe 1930 que recentralizou o país, como na época da monarquia. Vargas governou durante quinze anos ininterruptos, período onde refundou o Estado brasileiro e deu as bases para o desenvolvimento capitalista do país. Sua ditadura pessoal não fez desaparecer por completo as origens anteriores do Estado nacional brasileiro. Ao contrário, houve uma depuração, no interesse de manter a velha ordem, só que com mais habilidade política.

Nos anos posteriores a sua queda, em 1945, ele voltará à política, agora na condição de presidente eleito e líder nacionalista. Seu suicídio, em 1954, ajudou a refixar sua imagem, que se confundiu com a do próprio Estado, deixando marcas que chegam aos dias de hoje. De Vargas para cá, o Estado nacional brasileiro foi se constituindo em uma nebulosa que inclui interesses e contradições. Vargas ensinou gerações a se comportar de modo híbrido e camaleônico, adaptando-se a cada situação. Sua morte violenta atrasou o golpe que iria modificar a natureza do Estado, sem negar por completo suas origens.

O que hoje sabemos é que o desenvolvimento econômico brasileiro foi obra do trabalho dos brasileiros. Conseguiu frutificar, quando o Estado apropriou-se do mesmo. Em mãos privadas, as riquezas foram dissipadas e quase nada restou para as gerações que se sucederam. Mesmo com as elevadas taxas da corrupção oficial, o Estado ainda conseguiu acumular.

Não foi a ditadura militar (1964-1985) que levou mais longe o processo de modernização econômica do país. O estilo fascista de governar, nesta época, impediu que o desenvolvimento tivesse trazido progresso para as massas, que poderiam ter enriquecido, na época das vacas gordas, e se preparado melhor para as crises que viriam a seguir.

De certo modo, o sofrimento dos que se opuseram às ditaduras brasileiras marcou para sempre a história do Brasil. Sem artifícios retóricos, não se pode lembrar de Vargas sem a censura, a tortura e as prisões do Estado Novo. Não dá, igualmente, para esquecer os imensos sofrimentos impostos aos brasileiros no período militar que se encerrou em 1985, deixando cicatrizes e dívidas, ainda em aberto. As riquezas produzidas nestas épocas foram manchadas pelo sangue, bem como, pela exploração dos trabalhadores. Com estes fatos, a nebulosa do Estado nacional brasileiro ganhou novos contornos.

Nas últimas duas décadas, tudo ficou ainda mais complexo. Por um lado, o Estado incorporou as lutas dos trabalhadores e se reconstruiu de modo democrático-formal. Por outro, ele continua trazendo em seus contornos a herança de seu passado, escravista, elitista, conservador e fascista. Seus aparelhos ideológicos e burocrático-repressivos carregam sua história, para o bem e para o mal. Suas estruturas econômicas, ainda são bem fortes, apesar do abalo privatista e neoliberal, continuam a sustentá-lo.

Na materialidade do universo, as nebulosas são nuvens de poeira estelar. Podem ser brilhantes ou escuras, refletindo ou não a luminosidade do universo. São portadoras do passado e do presente do mesmo. A nebulosa do Estado nacional brasileiro não é um corpo estelar. É algo construído pelos homens e mulheres, ao longo de suas histórias. Por isso, estão em seus alcances o poder de modificá-la, mesmo que isto não seja fácil. Mais difícil ainda, talvez seja retirar da mesma, os restos de poeira morta, ultrapassada pelo tempo, que cisma em continuar presente na velha máquina.

Sem comentários: